As operações Carbono Oculto e Quasar, deflagradas recentemente pela Polícia Federal e Receita Federal, escancararam como o uso do Direito Tributário é central no combate ao crime organizado no Brasil. Juntas, elas investigam esquemas bilionários de sonegação, fraude fiscal e lavagem de dinheiro, especialmente no setor de combustíveis e no mercado financeiro. Para o advogado tributarista Luís Garcia, sócio do Tax Group e do MLD Advogados Associados, o paralelo com o caso de Al Capone, preso por evasão fiscal nos Estados Unidos, é inevitável: “o Direito Tributário é uma ferramenta poderosa de justiça e pode ser decisivo para enfraquecer organizações criminosas”.
Carbono Oculto: fraude bilionária no setor de combustíveis
Na operação Carbono Oculto, a Receita Federal identificou um esquema que teria causado prejuízo estimado em R$ 8,6 bilhões entre 2020 e 2024. O modelo envolvia desde adulteração de combustíveis e importação irregular de insumos até a utilização de fintechs como “bancos paralelos” e de cerca de 40 fundos de investimento para ocultação de patrimônio. Além de crimes fiscais, foram constatadas práticas de lavagem de dinheiro, estelionato, coação de empresários e até conexões com crimes ambientais e tráfico de drogas. Para garantir a recuperação do crédito tributário, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional bloqueou mais de R$ 1 bilhão em bens dos investigados.
Quasar: fundos de investimento usados como fachada
Já a operação Quasar expôs uma rede de lavagem de dinheiro sustentada por múltiplas camadas societárias e financeiras, dificultando a identificação dos beneficiários finais. Foram encontrados indícios de gestão fraudulenta e operações simuladas em instituições financeiras, além do uso de fundos de investimento para movimentações ilícitas. A Justiça Federal autorizou o sequestro de ativos e o bloqueio de bens até o limite de R$ 1,2 bilhão, além da quebra de sigilos bancário e fiscal de pessoas físicas e jurídicas envolvidas.
Arcabouço tributário como ferramenta de combate
Segundo Luís Garcia, as autoridades lançaram mão de um conjunto robusto de dispositivos legais — que vão da Lei de Crimes contra a Ordem Tributária (Lei 8.137/90) e do Código Tributário Nacional até a Lei de Lavagem de Dinheiro (Lei 9.613/98) e a Lei de Crimes contra o Sistema Financeiro (Lei 7.492/86). Esses fundamentos permitiram medidas como busca e apreensão, bloqueio judicial de bens, sequestro de ativos e afastamento de sigilos. “O recado é claro: a evasão fiscal não será tolerada e pode levar ao colapso de estruturas criminosas inteiras”, afirma.
Implicações para empresas e sociedade
O tributarista alerta que o caso serve de alerta não apenas ao crime organizado, mas também às empresas de setores sensíveis, como combustíveis e financeiro. “Medidas de compliance e auditoria fiscal são indispensáveis para mitigar riscos de corresponsabilidade. O fisco tem utilizado cada vez mais inteligência artificial e cruzamento de dados para detectar inconsistências, e a linha entre negligência e conivência pode ser tênue”, explica.
Ao comparar os casos recentes com a prisão de Al Capone, Luís Garcia conclui: “Assim como no passado, o combate à criminalidade financeira é componente vital da justiça. A legislação tributária, quando aplicada de forma estratégica, é capaz de atingir o coração de organizações que atuam em múltiplas frentes da economia”.