Diante do cenário de impactos das tarifas impostas pelos Estados Unidos sobre diversos produtos brasileiros, análises da Hedgepoint Global Markets apontam que a principal preocupação está relacionada ao aumento da inflação no país.
Isso se deve ao fato de os EUA serem um grande importador líquido e de muitos de seus parceiros comerciais terem sido tributados. No caso do Brasil, enquanto uma boa parcela das exportações foi isenta da taxa de 50%, o café não foi incluído na lista de isenção.
O Brasil se destaca como o maior fornecedor mundial de café e o que tem maior disponibilidade nesta época do ano. Os grãos brasileiros também representam cerca de 30% de todas as importações de café dos EUA. “Portanto, se as tarifas forem implementadas, os americanos podem enfrentar preços mais altos do café, potencialmente interrompendo os fluxos comerciais e, até mesmo afetando o cenário econômico. Nesse sentido, segundo a NCA (National Coffee Association), para cada dólar de café importado, 43 dólares são gerados na economia dos EUA”, diz Laleska Moda, Analista de Inteligência de Mercado da Hedgepoint.
Embora em linha com as expectativas, o IPC aumentou 0,3% em junho, elevando a taxa de inflação de 12 meses para 2,7%, acima da meta de 2% do Fed. Alguns analistas apontam que parte do movimento se deve ao efeito das tarifas, e esperam um crescimento maior nos próximos meses. Na última sexta-feira (01), a atualização da geração de empregos não agrícolas dos EUA também preocupou o mercado, já que não apenas os números de julho ficaram abaixo da expectativa do mercado, mas os números de junho e maio também foram revisados para baixo.
“Um enfraquecimento da economia dos EUA pode pressionar a política comercial de Trump e influenciar futuras decisões do Fed. Se as tarifas sobre o café realmente entrarem em vigor, elas poderão prejudicar a demanda”, afirma Laleska.
Importações de café dos EUA estavam em recuperação, mas tarifas podem mudar o cenário
As importações líquidas de café dos EUA estão aumentando em 24/25, acima do desempenho das duas últimas temporadas. Apesar do aumento dos preços para os consumidores, as importações estão agora mais alinhadas com os níveis médios históricos de 10 anos, mostrando que esse mercado pode ser mais resiliente do que o esperado anteriormente, já que cerca de 76% dos americanos bebem café, de acordo com a NCA. No entanto, o novo cenário comercial traz incertezas, na avaliação da analista.
Colheita da safra 25/26 do Brasil está em fase final
Enquanto a colheita do Conilon/Robusta 25/26 está quase concluída, o trabalho de campo do Arábica também está em fase final, confirmando uma queda na produção dessa variedade. “Além disso, houve relatos de problemas de qualidade nas últimas semanas, principalmente em relação à quantidade de grãos moca e qualidade de bebida. Por outro lado, a produção total brasileira deve ficar em níveis semelhantes aos da temporada 24/25, dado o maior volume de Conilon”, explica.
A analista também ressalta que o aumento da oferta de Conilon também continua a ampliar a diferença de preço entre essa variedade e o Arábica, o que provavelmente levará a mudanças nos blends domésticos com maior teor de Conilon.
“Apesar do fim da colheita e da maior disponibilidade de café, as vendas no mercado físico continuam lentas. Muitos agricultores optaram por ficar fora do mercado nos últimos meses devido a uma queda de preço impulsionada pela pressão de oferta relacionada à colheita. Isso levou a vendas abaixo da média. Com novas preocupações surgindo em torno da política comercial dos EUA, essas condições podem persistir”, diz.
Nas últimas semanas, a oferta pressionou para baixo os diferenciais brasileiros, que haviam permanecido acima dos de outras origens durante a maior parte do primeiro semestre de 2025. Na visão da analista, como essas origens também estão na entressafra, o mundo dependerá mais do grão brasileiro. Isso poderia fornecer um suporte aos preços no curto prazo, uma vez que cafeicultores têm pouco interesse em novas vendas.
O clima deve ser monitorado em outras origens
A maioria dos outros países produtores de café está agora em seu período de desenvolvimento para a temporada 25/26. Na Ásia, o Vietnã pode ter uma recuperação na produção, dados os maiores investimentos e as condições climáticas positivas, apesar de um julho mais seco.
A produção dos países da América Central também tende a ter um desempenho semelhante ou ligeiramente acima de 24/25, devido às melhores perspectivas climáticas, com um cenário neutro para o ENSO. No entanto, para Moda, podem haver novas redução na produção da Colômbia, devido ao excesso de chuvas durante a florada.
Balanço global e comportamento dos preços
“Inicialmente estamos considerando uma ligeira queda de 1,1% na demanda em 24/25 (o atual ciclo nos destinos) no nosso cenário base, avaliando a atual tendência das importações da UE, mas ainda com um déficit em 24/25. Para 25/26, se considerarmos uma demanda mais estável, o melhor panorama seria um saldo próximo de zero. Novas tarifas dos EUA, no entanto, podem mudar o cenário,” afirma.
“Em um exercício em que ainda há a possibilidade de um maior impacto na demanda nos EUA caso as tarifas entrem em vigor, consideraríamos uma nova queda em 24/25, levando a um déficit menor. Em geral, também temos que ter em mente que, não apenas o cenário comercial e macroeconômico atual é instável, mas a maioria dos plantios de outros países produtores ainda estão em seu período de desenvolvimento, o que pode trazer mudanças no cenário global de oferta e demanda,” explica.
Neste cenário, de acordo com a analista, os preços devem continuar altamente voláteis, especialmente no curto prazo, com todas as incertezas entre o comércio de café do Brasil e dos EUA. No médio prazo, e com a expectativa de redução das incertezas tarifárias, o clima na primavera brasileira será fundamental para o desenvolvimento da safra 26/27 e para a evolução dos preços.