A turbulência que marca as relações políticas e econômicas entre Brasil e Estados Unidos escalou severamenete nos últimos dois dias, com os movimentos mais intensos desde a carta do presidente americano Donald Trump – com as tarifas ao governo brasileiro tendo sido registrado nesta quinta (17) e sexta-feira (18).
Entre estes dias, o ex-presidente Jair Bolsonaro respondeu Trump sobre uma carta pessoal que ele lhe enviou, o presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, fez um pronunciamento nacional trazendo críticas severas ao chefe de estado norte-americano e hoje Bolsonaro foi alvo de uma operação da Polícia Federal e pasa a usar tornozeleira eletrônica, por decisão do ministro Alexandre de Moraes, do STF (Supremo Tribunal Federal), além do cumprimento de outras medidas cautelares.
Bolsonaro é investigado pela PF pelos crimes de coação no curso do processo, obstrução à Justiça e ataque à soberania nacional, e tal investigação se deu na sequência do presidente dos Estados Unidos anunciar as tarifas sobre os produtos brasileiros em razão, entre outros motivos, pela perseguição política a Jair Bolsonaro. O ex-presidente do Brasil chamou o que está vivendo de “suprema humilhação” e afirmou não ter dúvidas de que será condenado pelo STF.
Leia mais:
+ Na Reuters: Bolsonaro diz não ter dúvida de que será condenado pelo STF
+ Moraes diz que tarifa de Trump visa interferir no STF e vê crimes de Bolsonaro e Eduardo
A decisão de Moraes é uma resposta direta a Trump. “Alexandre de Moraes sempre dobra a aposta quando ele se sente ameaçado e sim, ele está respondendo a Trump. A Casa Branca está acompanhando isso de perto e haverá consequências”, afirma o cientista político do Canal Dextra, o professor Paulo Moura. “E acredito sim que haverá consequências econômicas, com os EUA podendo anunciar novas sanções. Analistas de mercado estão fazendo esta leitura”.
A confusão e a mistura inevitável, e amarga, das cenas política e econômica entre as duas maiores economias das Américas expõe, novamente, a falta de inteligência estratégica do governo brasileiro já desde o anúncio das tarifas. O mercado respondeu rapidamente, diversos setores da economia nacional sentiram em cheio – em ambos os países – e a morosidade com a qual lida com o assunto a equipe de Lula preocupa dos parlamentares em Brasília, aos produtores rurais no Brasil, passando pelos consumidores norte-americanos, hojes os maiores clientes do café, do suco de laranja e dos ovos do Brasil, só para começar a lista.
Em suas redes socias, a senadora Tereza Cristina, lamentou o que chamou de “escalada dos fatos”. “Tenho defendido sempre cautela e maturidade para enfrentarmos os graves problemas do Brasil — inclusive para manter abertas as negociações sobre tarifas que tanto podem prejudicar o nosso povo”, disse.
Veja:
Um dia antes, criticou o presidente Lula por sua “bravata populista”, pedindo que o governo atue com mais pragmatismo e celeridade para que os “problemas de verdade” possam ser, enfim, resolvidos. “Em vez de criar atrito, poderia começar tentando resolver o tarifaço do Trump, que afeta o povo brasileiro. É preciso agir antes que a gente sofra (ainda mais) com a alta no custo de vida e o desemprego. Menos palanque, mais trabalho”.
E antes da escalada, Tereza Cristina já havia alertado sobre a demora do governo para agir. “Já deveria ter enviado alguém do primeiro escalão, com poder de decisão, para mostrar aos americanos a realidade: este é um jogo onde todos perdem. Dizem que não estão conseguindo contato, mas é preciso insistir. Cada dia de atraso significa mais empresas em risco.Confio na força do povo brasileiro, mas precisamos de ação imediata”.
A análise de Paulo Moura corrobora à da senadora e ex-Ministra da Agricultura, relatando que o Brasil não tem canais de negociação com os Estados Unidos.
“O governo Lula nunca se esforçou para isso e o presidente Trump deixou o Brasil sem embaixador. O embaixador anterior, indicado por Joe Biden, saiu quando houve a troca de presidentes, e Trump não indicou um novo. Há hoje um adido comercial e um adido militar, que não fala português e que foi proibido de manter contato de alto nível no Brasil. Então, não há canais de contato e o que estamos assistindo é a escalada de uma confrontação do Brasil contra os Estados, de Lula e Alexandre de Moraes contra o presidente Trump. E as consequências disso são graves”.
Internamente, Moura acredita que a opinião política esteja ainda mais atenta a forma como todo este quadro se desdobra e quais são os impactos disso para o Brasil, para além da polarização política. “O impacto deste fato é de grande magnitude. O Alexandre de Moraes em conluio com o Lula – é bom lembrar que Moraes liberou o IOF e fechou o pacto com o Lula – estão, ambos, peitando o governo Trump. Lula por questões eleitorais, Alexandre de Moraes por uma questão de sobrevivência. Agora é tudo ou nada. A crise subiu alguns degraus e acredito que vai subir mais”.
Em entrevista ao Bom Dia Agronegócio desta quinta-feira (17), o diretor da Pátria Agronegócios, Matheus Pereira, explicava que o Brasil é o segundo país que mais perdeu capital especulativo nos últimos sete dias, ficando atrás apenas de Taiwan. “É o puro mercado refletindo que não é só uma briga ideológica. O mercado, dono do dinheiro, soberano nisso, vê que o Brasil hoje não é uma fonte segura de investimento”.
Pereira complementa dizendo que os dados não se referem à balança comercial ou fluxo financeiro regular, mas especificamente ao capital especulativo que movimenta mercados. A percepção de risco político está afetando diretamente os investimentos no país, com reflexos inevitáveis no agronegócio.
Neste ambiente, a semana vai terminando com a agenda econômica do Brasil sequestrada pela escalada das tensões políticas com os Estados Unidos, agravada pelo sentimento – principalmente entre os agentes do mercado – de que poderão se intensificar ainda mais. Assim, o dólar sobe mais de 0,7% para novamente se aproximar dos R$ 5,60, enquanto o Ibovespa testava suas mínimas, perdendo mais de 1%.
“O governo Lula avalia a dimensão dos prejuízos e discute possíveis respostas, como quebra de tarifas e patentes e tarifas sobre produtos culturais. O mercado segue sensível à escalada da tensão com discurso duro de Lula ontem à noite, classificando as tarifas como “chantangem inaceitável”. O clima político pesa sobre os ativos brasileiros. O ambiente permanece volátil, à espera de decisões concretas”, explicam os analistas de mercado da Agrinvest Commodities.